quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Manobras obscenas



Documento da própria Ferrous comprova envolvimento de Hartung em esquema milionário

Até agora, o ex-governador Paulo Hartung se fez de rogado frente às denúncias da “Operação Lee Oswald”, deflagrada pela Polícia Federal em Presidente Kennedy, em abril último. Parte das denúncias diz respeito a transações nebulosas de compra e venda de terrenos no município sulista. As operações foram empreendidas pela ZMM Empreendimentos e Participações LTDA e BK Investimentos e Participações Ltda. Empresas criadas única e exclusivamente com o propósito de promover as “negociatas” que movimentaram mais de R$ 110 milhões com a venda de terrenos para a Ferrous Resources. 

A empresa pretende, ou pretendia, instalar no município um mineroduto, uma pelotizadora e um porto de águas profundas, mas o projeto ainda não saiu do papel. Desde que as denúncias vieram à tona, uma série de reportagens de Século Diário apontou evidências de que o ex-secretário da Fazenda José Teófilo e o ex-governador Paulo Hartung eram os principais articuladores do esquema montado em Kennedy. Hartung nunca se pronunciou sobre as denúncias. Já Teófilo, fez o papel de escudo do ex-governador e saiu distribuindo notas para imprensa para tentar convencer à opinião pública de que o negócio era lícito.


As evidências, no entanto, apontavam que o esquema começou dentro do governo Hartung, que se valeu de sua posição de chefe do Executivo para conceder incentivos fiscais que viabilizariam o projeto da Ferrous no Estado. As benesses, ao contrário do que justificou José Teófilo no momento em que o escândalo vazou, tinham mão dupla. Se colocando como porta-voz do ex-governador, o ex-secretário afirmou que “o governo do Estado não concedeu ‘milionária isenção’, e sim incentivos fiscais à Ferrous. Incentivos fiscais existem em todos os estados brasileiros, sempre voltados para a busca de investimentos econômicos que gerem empregos e atividade econômica”, justificou. O ex-secretário também julgou normal a empresa Éconos, da qual ele e Hartung são sócios, prestar consultoria à Ferrous. Teófilo também negou qualquer participação da empresa BK Investimentos e Participações Ltda nas “negociatas” de compra e venda de terrenos em Kennedy.

O documento revelado pela reportagem, em destaque nesta edição, no entanto, derruba os argumentos de Teófilo e envolvem a BK, a Éconos, Hartung e Teófilo nas transações fraudulentas no município de Presidente Kennedy. O documento, assinado pelo próprio executivo da Ferrous, fornece as peças que faltavam para fechar o ‘quebra-cabeça” da corrupção armado em Kennedy. O documento, por exemplo, confirma que em pouco menos de 90 dias as “empresas-lavanderias” movimentaram R$ 110 milhões vendendo e comprando terrenos. As empresas, que mais tarde movimentariam milhões, foram criadas com capitais sociais irrisórios que giravam em torno de R$ 5 mil. A Éconos, inclusive, seguiu o mesmo esquema de criação das demais empresas envolvidas no esquema. Hartung, por exemplo, entrou com modestos R$ 3 mil para responder por 30% da consultoria, que tinha o capital social total de R$ 10 mil. As transações de compra e venda de terrenos, todas registradas em cartório, já são suficientemente sólidas para mostrar que havia um esquema ilícito em Kennedy. Senão, como explicar que uma área medindo 61,99 alqueires, avaliada em R$ 180 mil no dia 9 de julho de 2008, seria negociada, uma semana depois, por R$ 600 mil; após nove dias seria comprado pela ZMM por R$ 12,3 milhões e, finalmente, revendida à Ferrous, no dia 4 de agosto do mesmo ano, por R$ 27,9 milhões? Existe negócio mais lucrativo?

O documento da Ferrous e as reportagens de Século Diário deixam patente que Paulo Hartung se valeu de sua posição de governador para fornecer informações privilegiadas ao ex-secretário, que seria futuramente seu sócio no Éconos, José Teófilo. O esquema é simples. Teófilo, sabendo que a Ferrous se instalaria em Kennedy – ou pelo menos havia um projeto para isso -, monta uma “empresa-lavanderia” para comprar terrenos baratos e vendê-los a preço de ouro para a Ferrous. O governador, em troca, concederia incentivos fiscais à empresa e facilitaria as licenças ambientais e outras exigências burocráticas que geralmente tornam esse processo para liberação de uma grande planta industrial, nos moldes da proposta da Ferrous, moroso e caro.

O esquema é tão óbvio que, à primeira vista, parece improvável. Mas, na verdade, a obviedade se dá pela certeza de seus operadores na impunidade. Afinal, quem iria imaginar que um ex-governador e um ex- secretário de Estado estariam metidos em manobras obscenas em torno de compra e venda de terrenos na distante e acanhada Kennedy? ”