quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Bandidos e providência

Por João Batista Damasceno*


Rio - A execução do trabalhador rural sem terra Cícero Guedes, em Campos, expressa a forma como é tratada a parcela da população que ousa exigir direitos assegurados a poucos. O movimento do qual participava quer, para produzir alimentos, o mesmo que o Estado garante ao agrobusiness: direito de propriedade. Mas seus companheiros são criminalizados, desqualificados ou assassinados como ele o foi. As instituições devem ser referência de ordem e redutoras das incertezas do futuro. A criminalização dos movimentos sociais os torna vulneráveis perante tais instituições, bem como perante o crime organizado em conluio com agentes públicos.

Para a polícia, o assassino de Cícero era um traficante que se infiltrara no acampamento pretendendo sua dominação. Mas, em nota, o movimento afirmou que “o acusado não possui nem nunca possuiu vínculo com o MST. O acusado representava interesses criminosos que pela força tentaram dominar o acampamento”. Esclarecido o assassinato, é preciso investigar a serviço de que interesses atuava o acusado.

Nenhuma instituição ou organização social, seja templo religioso, poder do Estado, ONG ou associação de moradores, está isenta da possibilidade de sofrer infiltração por postulantes de interesses escusos.

A possibilidade de apropriação de organizações sociais por criminosos é realidade. Em tempos passados, no subúrbio do Rio, um grupo de paramilitares se apoderou da organização da festa de São Jorge e queria cobrar taxa até do padre. O Estado, que serve a alguns, precisa ser apropriado pela sociedade, a fim de que possa se colocar ao lado dela em defesa dos seus interesses e do seu processo de organização. Afinal, o Estado há de ser expressão da sociedade civil, e não o seu rival. Num Estado legitimado pela maioria, expressão da democracia, a providência não há de se manifestar por seres ocultos que conduzam as coisas, mas a previdência ou medidas prévias para alcançarmos conjuntamente os fins que desejamos.

*João Batista Damasceno é Doutor em Ciência Política pela UFF e juiz de Direito. Membro da Associação Juízes para a Democracia